STJ não “vê” estupro e absolve homem de 20 anos que tinha relação com adolescente de 13

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou, por maioria, a absolvição de um homem acusado de estupro de vulnerável. O réu, então com 20 anos, manteve relações sexuais com uma adolescente de 13 anos. Embora o Código Penal estabeleça que qualquer relação sexual com menor de 14 anos é crime, independentemente do consentimento da vítima, o relator do caso argumentou que não havia provas suficientes para demonstrar que o acusado se aproveitou da vulnerabilidade da vítima.

O ministro Sebastião Reis Júnior, relator do caso, afirmou que a suposta vítima não aparentava estar vulnerável ou incapaz de entender e se posicionar sobre os fatos. Ele defendeu a absolvição do réu para evitar uma condenação que considerou “desproporcional e injusta”, ressaltando que o jovem “não possui outros deslizes pessoais”. O relator também destacou a necessidade de avaliar a gravidade do dano causado à vítima para determinar se o acusado realmente merecia punição. A Sexta Turma, especializada em direito penal, é composta exclusivamente por ministros homens.

Outro ministro, Antônio Saldanha Palheiro, acompanhou o voto do relator, argumentando que a condenação resultaria apenas em um caráter punitivo, sem benefícios reais para a sociedade, especialmente considerando que os fatos ocorreram há seis ou sete anos e as famílias envolvidas já estavam estabelecidas. O ministro Otávio de Almeida Toledo também apoiou essa visão, afirmando que a pena seria desproporcional à conduta.

Apenas um dos cinco ministros, Rogério Schietti Cruz, votou pela condenação. Ele rejeitou o argumento de que a convivência do homem com a adolescente por dois anos e meio eliminaria o crime de estupro de vulnerável. Schietti expressou preocupação com o precedente que a decisão poderia estabelecer, sugerindo que a extinção da punibilidade em casos semelhantes poderia legitimar condutas criminosas.

O Tribunal já havia confirmado a absolvição decidida em primeira instância. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) mencionou que a jovem, ao ser ouvida aos 18 anos, não relatou “qualquer abalo” causado pela relação, o que também foi corroborado por sua mãe. O Ministério Público estadual recorreu contra essa decisão, argumentando que a relação sexual comprovada configura estupro de vulnerável, independentemente do consentimento da vítima ou de seus responsáveis legais. No entanto, o STJ descartou essa tese, confirmando a absolvição pela maioria da Sexta Turma.

De acordo com o Artigo 217 do Código Penal, a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos é punida com reclusão de 8 a 15 anos.

O ministro Antônio Saldanha Palheiro questionou a utilidade pedagógica de aplicar uma pena nesse caso, argumentando que o réu, agora um homem trabalhador e chefe de família, já teria aprendido com o processo judicial, sem necessidade de ser inserido no sistema prisional degradado do Brasil. Por outro lado, o ministro Rogério Schietti Cruz alertou sobre o risco de romantizar circunstâncias que, embora comuns na sociedade, devem ser coibidas. Ele criticou a decisão do STJ por possivelmente abrir margem para que outros crimes semelhantes sejam cometidos sem a devida reprovação do Poder Judiciário.

VIOLÊNCIA SEXUAL NO BRASIL

Em 2023, o Brasil registrou um caso de estupro a cada seis minutos, um aumento de 6,5% em relação ao ano anterior, conforme o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Na maioria dos casos, as vítimas tinham até 13 anos de idade, o que caracteriza estupro de vulnerável, uma forma grave de violência sexual.

COMO DENUNCIAR

Vítimas de violência sexual não precisam registrar boletim de ocorrência para receber atendimento médico e psicológico no sistema público de saúde. No entanto, o exame de corpo de delito, que pode fornecer provas importantes para um processo judicial, só pode ser realizado com o boletim em mãos. O exame pode ser feito a qualquer momento após o crime.

Em casos de violência sexual em flagrante, o número 190 da Polícia Militar deve ser acionado. O serviço Ligue 180 também recebe denúncias de violência doméstica, orienta as vítimas e as encaminha para o serviço de acolhimento adequado. O atendimento pode ser feito pelo WhatsApp (61) 99656-5008.

Vítimas de estupro têm o direito de buscar qualquer hospital com atendimento de ginecologia e obstetrícia para receber medicação preventiva contra infecções sexualmente transmissíveis, atendimento psicológico e realizar a interrupção legal da gestação. Contudo, na prática, nem todos os hospitais oferecem esses serviços.