Nos primeiros sete meses de 2024, 25 milhões de pessoas passaram a fazer apostas esportivas em plataformas eletrônicas no Brasil, uma média de 3,5 milhões por mês. Para comparação, esse número é maior do que o tempo que o coronavírus levou para infectar a mesma quantidade de pessoas no país, o que ocorreu em 11 meses, de 26 de fevereiro de 2020 a 28 de janeiro de 2021.
Em um período de cinco anos, o total de brasileiros que apostaram nas chamadas “bets” chegou a 52 milhões. Desses, 48% são novos apostadores, ou seja, começaram a jogar nos primeiros sete meses de 2024. Esses dados são de uma pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva entre os dias 3 e 7 de agosto. O número de apostadores no Brasil equivale à população da Colômbia e é superior ao de países como Coreia do Sul, Espanha e Argentina.
O estudo também traçou o perfil dos apostadores. Cinquenta e três por cento são homens e 47% são mulheres. Quatro em cada dez têm entre 18 e 29 anos; 41% têm entre 30 e 49 anos; e 19% têm 50 anos ou mais. Além disso, 80% dos apostadores pertencem às classes CD e E, enquanto 20% são das classes A ou B.
Sete em cada dez apostadores jogam pelo menos uma vez por mês. Sessenta por cento dos que já ganharam uma aposta usam ao menos parte do prêmio para tentar a sorte novamente. De acordo com Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, a facilidade de apostar via celular, o apelo publicitário das bets patrocinando times e campeonatos brasileiros, e a dinâmica envolvente do jogo são os principais atrativos dessas plataformas.
“A pessoa pode apostar em quem vai marcar o gol, se o gol será no primeiro ou no segundo tempo, como ficará a tabela do Campeonato Brasileiro, se alguém será expulso, entre outros. Isso cria a sensação de que sempre há algo a ser ganho. No final, a pessoa perde mais do que ganha, mas essa sensação de vitória é muito forte e alimenta a ideia de que está sempre ganhando”, comenta Meirelles.
Endividamento e Impactos Econômicos
A pesquisa do Instituto Locomotiva também revelou que 86% dos apostadores possuem dívidas e 64% estão negativados na Serasa. Entre as pessoas endividadas e inadimplentes no Brasil, 31% jogam nas bets. “Quando uma pessoa endividada recorre às apostas, muitas vezes para tentar sair da dívida, isso indica que há algo errado”, pondera Renato Meirelles.
A difícil situação econômica do país contribui para que “ganhar dinheiro” seja o principal motivo apontado por 53% dos entrevistados para apostar online. Esse motivo supera outros como “diversão/entretenimento/prazer” (22%), “emoção e adrenalina” (10%), “passar o tempo” (7%), “curiosidade” (6%) e “alívio do estresse” (2%).
Meirelles alerta para o impacto das apostas eletrônicas na saúde mental, considerando o fenômeno uma “pandemia”. A pesquisa coletou opiniões sobre os efeitos psicológicos das apostas e mostrou que 67% dos entrevistados conhecem pessoas viciadas em apostas esportivas.
Impacto Emocional
O levantamento também apontou que 51% dos entrevistados acreditam que o jogo aumenta a ansiedade, 27% observam mudanças repentinas de humor, 26% associam o jogo ao estresse, e 23% mencionam sentimentos de culpa. Entre os próprios apostadores, seis em cada dez admitiram que a prática afeta seu estado emocional, causando ansiedade (41%), estresse (17%) e culpa (9%).
O relatório ainda destaca que 45% dos apostadores entrevistados afirmaram que as apostas já causaram prejuízos financeiros, 37% usaram dinheiro destinado a outras coisas importantes para apostar, e 30% relataram prejuízos nas relações pessoais.
Por outro lado, também foram registrados sentimentos positivos associados às apostas, como emoção (54%), felicidade (37%) e alívio (11%). Para 42% dos entrevistados, as apostas esportivas online são uma forma de escapar de problemas ou emoções negativas.
A pesquisa entrevistou 2.060 pessoas com 18 anos ou mais, de 142 cidades de todo o Brasil, entre os dias 3 e 7 de agosto, por telefone em uma plataforma de autopreenchimento. A margem de erro é de 2,1 pontos percentuais com um intervalo de confiança de 95%.
O aumento no número de apostadores a partir de janeiro deste ano ocorreu após a sanção da Lei 14.790/2023, que regulamentou as apostas esportivas no Brasil. Atualmente, o Ministério da Fazenda analisa 113 pedidos de regulamentação de plataformas de apostas online.